Leigos: testemunhas de Deus na metrópole

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02/09/2015 - 14:45

Antes de encerrar agosto, “mês das vocações” no Brasil, a Igreja recorda a vocação dos leigos e leigas: também eles recebem um chamado de Deus para “trabalhar na messe do Senhor” e para participar ativamente na vida e na missão da Igreja. Não são apenas “beneficiários” da Igreja: são células vitais e membros vivos do corpo de Cristo, povo de Deus, que se expressa no mundo e dá o testemunho do Evangelho por eles.

Há 50 anos, o Concílio Vaticano II trouxe uma nova compreensão para a participação dos leigos na vida e na missão da Igreja: “pelo Batismo, eles foram incorporados a Cristo, constituídos no povo de Deus e, a seu modo, feitos partícipes do múnus sacerdotal, profético e régio de Cristo” (Lumen gentium, 31). Esse é o fundamento da participação dos leigos na missão de Cristo, que se prolonga no mundo pela Igreja.

O mesmo texto anota, em seguida, que a missão dos leigos está voltada, sobretudo, para a “ordem secular” e não se confunde com a dos religiosos, ou dos ministros ordenados, padres e bispos: “é, porém, específico dos leigos, por sua própria vocação, procurar o reino de Deus, exercendo funções temporais, ordenando-as segundo Deus” (LG 31). O Concílio distingue as funções religiosas ou eclesiásticas, próprias dos ministros sagrados, das “funções temporais” dos leigos, que envolvem, por exemplo, a família, o trabalho, as profissões, o lazer, a cultura, as responsabilidades sociais e políticas.

O que precisa caracterizar a ação dos cristãos leigos é o “espírito evangélico”: sua missão é exercer funções temporais, “à maneira de fermento”, para que, de dentro das “realidades temporais”, eles possam contribuir para a santificação do mundo e a manifestação de Cristo aos outros, especialmente pelo seu testemunho de fé, esperança e caridade. A eles cabe, de modo especial, iluminar e ordenar de tal modo todas as coisas, às quais estão unidos, para que essas continuamente se façam e cresçam segundo Cristo, para o louvor do Criador e Redentor (LG 31).

Esses textos são fundamentais para o desenvolvimento da eclesiologia pós-conciliar, especialmente no que diz respeito ao laicato. Mesmo assim, é frequente ouvir que, atualmente, há mais leigos atuantes “dentro” da Igreja, em funções eclesiais propriamente ditas, do que no testemunho cristão “fora” da Igreja, exercendo “funções temporais”. Quero crer que se trate de uma leitura equivocada da realidade: de fato, os leigos que atuam “dentro” da Igreja têm maior visibilidade que os que atuam “no mundo”. Estes últimos, certamente, são a imensa maioria. Mesmo assim, é verdade que a atuação qualificada dos leigos no mundo precisa ser incentivada sempre mais.

Eles também são chamados, pelo Batismo, a desempenhar responsabilidades eclesiais e o que já fazem merece grande reconhecimento! No entanto, não podemos cair na tentação de valorizar apenas os leigos voltados para este âmbito de sua vocação: sua ação “no mundo” precisa ser valorizada e isso requer adequada formação e acompanhamento. E nem todos os leigos precisam desempenhar atividades “dentro” da Igreja: o católico que exerce sua profissão ou responsabilidade social, animado pelo Evangelho, ou que cuida bem de sua família, já está participando da missão da Igreja.

Nos dias 28 a 30 de agosto, o Cardeal Lluis Martínez Sistach, de Barcelona, visitou São Paulo e teve diversos colóquios sobre o tema - “Deus na cidade, a Igreja na Metrópole”. As grandes cidades desafiam a Igreja a anunciar nelas a Boa-Nova e a testemunhar a presença amorosa e benfazeja de Deus, que ama todos os seus filhos. Ele se referia, justamente, à atuação insubstituível dos cristãos leigos na cidade, onde seu campo de ação é imenso e onde eles podem contribuir muito para humanizar as metrópoles e para que o amor e a ternura de Deus sejam manifestados a toda a população.

O Papa Francisco tratou dessa missão na Exortação Apostólica “Evangelii Gaudium -sobre o anúncio do Evangelho no mundo atual”. Fala da “dimensão social da evangelização” e convida a todos os batizados a serem testemunhas do Evangelho para a vida do mundo (cf.cap. IV). Os leigos são testemunhas do reino de Deus e obreiros da messe de Deus, que se estende para todos os âmbitos da cidade.

Publicado no jornal O SÃO PAULO - Edição 3067 de 2 a 8 de setembro de 2015