'Nos hospitais onde há assistência espiritual os pacientes têm recuperação mais rápida’

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Padre João Mildner, assistente eclesiástico da Pastoral da Saúde da Arquidiocese de São Paulo fala sobre a atuação da pastoral e a importância da assistência religiosa junto aos doentes
Publicado em: 16/02/2017 - 18:15
Créditos: Fernando Geronazzo/ Jornal O SÃO PAULO

Assistente eclesiástico da Pastoral da Saúde da Arquidiocese de São Paulo há dois anos, Padre João Inácio Mildner atua há 25 anos como capelão do Instituto de Infectologia Emílio Ribas e é membro do Conselho Estadual de Saúde.
Em entrevista concedida ao O SÃO PAULO, por ocasião do Dia Mundial do Enfermo, celebrado no sábado, dia 11, Padre João falou sobre a atuação da Pastoral da Saúde e a importância da assistência religiosa junto aos doentes. Confira a entrevista:

O SÃO PAULO – Como está a Pastoral da Saúde da Arquidiocese?

Padre João Inácio Mildner – Estamos implantando um novo modelo de Pastoral da Saúde, no sentido de dar maior corresponsabilidade à equipe e dinamizar cada região episcopal a partir de suas necessidades específicas. Este ano, por exemplo, os cursos promovidos pela Pastoral são organizados por cada região com o nosso acompanhamento. Esperamos ter em torno de 300 pessoas participando desses cursos, que começam em março. Outra conquista foi o curso de pastoral hospitalar, um pedido do nosso arcebispo, Cardeal Odilo Pedro Scherer, com o objetivo de preparar pessoas que atuem especificamente nos hospitais. No ano passado, 82 pessoas participaram do curso. Também avançamos no que diz respeito às políticas públicas para saúde. Nós nos reunimos uma vez por mês para tratar do assunto. O grande passo foi o primeiro encontro dos militantes das políticas públicas de saúde, realizado no ano passado
Como tem sido o trabalho no âmbito paroquial?

A primeira dimensão da Pastoral da Saúde é voltada às paróquias e comunidades, onde é dada assistência ao doente no domicílio. Tanto assistência espiritual quanto a caridade em si com aquele que sofre. Buscamos levar a comunidade ao doente e o doente à comunidade.  Antes de tudo, é preciso acolher e manifestar a solidariedade da comunidade para com quem sofre. Levar os sacramentos é muito importante. Mas é preciso também fazer com que a comunidade se empenhe com aqueles enfermos que muitas vezes estão abandonados, seja em bairros nobres ou mais pobres, e necessitam de atenção e cuidado.

Essa atenção também é voltada para com a família dos enfermos?

Também orientamos que os agentes da Pastoral sejam presença amiga para com as famílias e, antes de tudo, se coloquem a serviço. Muitas vezes, o próprio agente pode suprir pequenas necessidades, como levar o enfermo para uma consulta médica ou buscar um medicamento. Enfim, fazer o possível para aliviar o “fardo” que a família também tem para cuidar de um doente em casa. Há relatos, por exemplo, de agentes que visitaram o doente, encontraram-no abandonado, se reuniram e foram limpar a casa dele. Isso é bonito!

E quanto à pastoral hospitalar?

Trata-se da visita leito a leito, tanto onde há uma capelania organizada quanto onde simplesmente há abertura para a presença da Pastoral. Celebrar, atender e auxiliar os pacientes para que possam participar das missas que são celebradas nos hospitais. Em resumo, é fazer o doente se sentir Igreja mesmo estando internado num hospital. Há muitos pacientes internados que, por inúmeras razões, não recebem visitas frequentes de seus familiares. Por isso, a presença da Igreja no hospital não se restringe ao sacerdote, mas também a presença amiga dos leigos é importantíssima. No Emílio Ribas, por exemplo, temos cem leitos, mas após a reforma serão 400. É imprescindível a colaboração dos agentes de pastoral para que haja uma assistência integral. Um padre sozinho não daria conta.

Como é feito o acompanhamento das capelanias dos hospitais?

Estamos buscando uma maior articulação das capelanias dos diferentes hospitais da cidade e auxiliando na implantação onde ainda não há. Hoje contamos com 15 capelanias nos principais hospitais. Algumas possuem um padre liberado para esse trabalho e outras contam com a assistência de padres das paróquias onde estão localizadas.  Para que haja mais unidade nos trabalhos, este ano começaremos a fazer reuniões periódicas com os capelães hospitalares. É interessante também observar que tem havido solicitação por parte dos próprios hospitais para a implantação de capelanias.

A que se deve esse interesse?  

Estudos comprovam que nos hospitais onde há assistência espiritual, os pacientes têm uma recuperação mais rápida. Em consequência disso, há uma economia de recursos, o que estimula o interesse por parte das administrações das instituições para que haja tal assistência. Essa cultura é muito forte nos Estados Unidos e começa a ganhar força no Brasil. Sem contar que a assistência espiritual é um direito do paciente e a própria Organização Mundial da Saúde (OMS) reconhece sua importância. Nós conseguimos, por meio do Conselho Estadual de Saúde, uma resolução que determina que nenhuma instituição pública de saúde do Estado de São Paulo pode impedir assistência religiosa. Isso também acaba servindo de referencial para entidades particulares, filantrópicas e municipais.

Para isso, é preciso uma formação desses agentes hospitalares...  

Com certeza. Esse trabalho não pode ser amador. Lidamos com seres humanos fragilizados que lutam pela vida. O curso de pastoral hospitalar, além de apresentar a visão teológica e pastoral da saúde, também trata de questões específicas dessa área. Conhecemos os trabalhos dos diferentes profissionais que atuam num hospital.

Também é realizado um trabalho junto aos profissionais da saúde?

Sim. Muitas vezes olhamos somente para os doentes, mas quantos profissionais sofrem para poder cuidar dos pacientes. Quanta renúncia! Nos casos, por exemplo, de pacientes que têm prognóstico fechado, o profissional precisa se dedicar para amenizar o sofrimento dessa pessoa que se sabe que irá morrer em breve. Precisamos ter consciência que no mundo da saúde também trabalhamos com o insucesso. Esses profissionais são muito abertos à nossa presença. Muitas vezes, nos procuram para conversar e até para conhecer melhor a visão da ética cristã diante de algumas situações. Por isso, estamos preparando para o segundo semestre, e em breve será divulgado, um curso para os profissionais da saúde, com o objetivo de reunir médicos, enfermeiros, nutricionistas entre outros profissionais cristãos da área.

Como tem sido a presença da Igreja nos conselhos de saúde?
Nós da Arquidiocese temos muitos membros que participam dos conselhos gestores e comunitários de saúde, bem como nos conselhos municipal e estadual. A pastoral é da saúde, não da doença. O nosso esforço é em defesa da dignidade e da vida da pessoa. Quanto mais atuarmos nos conselhos tanto mais poderemos levar para a população a visão da Igreja sobre saúde. Essa preocupação é fundamental. Nós não queremos somente cuidar dos enfermos, mas cuidar para que o povo tenha saúde.

 

Entrevista publicada no Jornal O SÃO PAULO - Edição 3138 - De 15 a 21 de fevereiro de 2017