Cardeal Scherer apresenta à imprensa comissão para proteção de menores

A A
Novo organismo arquidiocesano aplica as recentes normas pontifícias para prevenção e combate aos abusos cometidos por clérigos e religiosos contra menores e vulneráveis
Publicado em: 05/03/2020 - 17:45
Créditos: Redação

O Cardeal Odilo Pedro Scherer, Arcebispo de São Paulo, concedeu uma entrevista coletiva na manhã desta quinta-feira, 5, na Cúria Metropolitana, para apresentar a criação da comissão arquidiocesana para a proteção de menores e vulneráveis contra abusos sexuais.

Instituída na Quarta-feira de Cinzas, 26 de março, a comissão, que entrará em vigor no próximo dia 8, tem como objetivo aplicar as diretrizes da Carta apostólica, em forma de Motu Proprio, Vos estis lux mundi, promulgada pelo Papa Francisco em maio de 2019, com normas para prevenir e combater abusos sexuais contra menores e pessoas em situação de vulnerabilidade, cometidos por clérigos e membros de Institutos de Vida Consagrada e Sociedades de Vida Apostólica, bem como as situações de abuso de autoridade destes que favoreçam delitos contra o Sexto Mandamento da Lei de Deus.

Dom Odilo explicou aos jornalistas que o Motu Proprio do Papa Francisco é um documento legislativo e não doutrinário, que complementa o código de direito canônico na matéria específica, neste caso, em relação aos abusos sexuais cometidos por clérigos e religiosos.

“Este Motu Proprio expressa mais uma vez a preocupação do Papa com fatos de abusos sexuais de menores, de pessoas em situação e vulnerabilidade, de abuso de autoridade para cometer crimes sexuais mesmo sendo contra pessoas adultas, e, também, delitos em relação à posse, produção e transmissão de material pornográfico envolvendo menores”, informou o Cardeal.

EMPENHO DA IGREJA

O Arcebispo recordou que há muitos anos esses escândalos têm vindo à tona e causam um enorme mal, em primeiro lugar, às vítimas, como também à própria Igreja e à credibilidade da sua pregação.  

“Por isso, o Papa Francisco, assim como já fizeram Bento XVI e João Paulo II,  está muito empenhado para que esses abusos sexuais sejam superados no âmbito não só do clero, mas da Igreja, de modo geral, também entre fiéis”, afirmou Dom Odilo, ressaltando que o recente documento pontifício trata especificamente do âmbito dos abusos cometidos por clérigos e religiosos.

O Cardeal salientou, ainda, que o Motu Proprio de Francisco destaca o quanto os abusos sexuais não são só pecados contra a lei de Deus, mas também são delitos contra pessoas tanto no âmbito civil quanto na legislação eclesiástica. O documento indica como tais delitos devem ser combatidos e quem tem responsabilidade para tal.

NAS IGREJAS LOCAIS

“O Papa dispõe que em todas as dioceses do mundo e em todas as congregações e ordens religiosas haja um ou mais organismos, mecanismos ou instrumentos que diretamente sejam destinados a zelar para que se cumpra o que está deliberado pela legislação eclesiástica e para acolher as eventuais denúncias nesse campo”, completou Dom Odilo.  

Nesse sentido, o Cardeal esclareceu que cada Igreja local está buscando corresponder a essa disposição pontifícia segundo suas realidades específicas e, no caso da Arquidiocese de São Paulo, foi decidida a criação dessa comissão para justamente aplicar integralmente o que dispõe o Motu Proprio.  

Para isso, junto com o decreto de criação do organismo, foi publicado um Regulamento que explica os detalhes da organização da comissão, sua constituição, funções e competências, além e indicar como as denúncias podem ser feitas e quais encaminhamentos serão dados para que sejam devidamente apuradas.

O Regulamento também enfatiza o dever de todos os clérigos e religiosos, independentemente de fazer parte ou não da comissão, em relação ao acolhimento de pessoas que foram vítimas ou que tenham alguma denúncia a fazer.

CONTINUIDADE 

“Com esta comissão, nós queremos dar continuidade a um trabalho que não se inicia agora, mas vinha sendo feito de acordo com aquilo que já previa o Direito Canônico. A comissão traz alguns elementos novos sobre a tutela e encaminhamentos as serem feitos”, reforçou o Arcebispo.

“Temos a esperança de que isso possa ajudar não só os nossos clérigos e religiosos, mas todo povo e à nossa comunidade a estar muito alerta em relação a essa questão dos abusos sexuais”, manifestou o Cardeal.

Dom Odilo afirmou, ainda, que a criação da comissão pode ser entendida como um esforço ulterior da Igreja para a superação de um problema concreto que requer um enorme empenho de mudança de cultura, de postura e que não atinge somente os clérigos.

“Sabemos que grande número de abusos sexuais não acontece no âmbito dos clérigos. Nós, aqui, tentamos assumir as nossas responsabilidades”, enfatizou, reconhecendo que nem sempre é fácil investigar tais denúncias, já que nem sempre são fatos comprováveis ou verificáveis, uma vez que acontecem no âmbito da intimidade das pessoas envolvidas. “Porém existe o esforço para se chegar aos fatos”, completou.  

‘OUVIDORIA’

O Cardeal informou que a comissão, que será coordenada pelo Padre Ricardo Cardoso Anacleto, doutor em Direito Canônico, terá como membros outros sacerdotes, diáconos, religiosos, leigos, profissionais das áreas do direito e da psicologia.

Recordando a afirmação feita na entrevista publicada pelo jornal O SÃO PAULO na quarta-feira, 4, Dom Odilo esclareceu que a comissão não será um tribunal para julgar denúncias de abusos sexuais nem emitir sentenças, mas funcionará como uma ouvidoria para acolher as denúncias e encaminhar as questões para a instâncias competentes. “Os encaminhamentos depois da denúncia são diversos, conforme prevê Motu Proprio e legislação ordinária da Igreja”, disse.

O Arcebispo informou aos jornalistas que antes mesmo da criação da comissão, a Arquidiocese de São Paulo já verificou diversas denúncias e chegou a afastar clérigos após a devida apuração e julgamento dos casos. “Na Arquidiocese, toda denúncia que chega a nós e é formalizada, sempre procuramos ir atrás”, frisou.

Dom Odilo reforçou que o regulamento da comissão deixa claro que as pessoas que apresentarem denúncias serão orientadas a também procurar as autoridades civis competentes. “É dever de todo cidadão, tendo ciência de um crime, denunciá-lo”, afirmou.

As denúncias para a comissão poderão ser feitas presencialmente, via e-mail ou por meio de carta registrada.

CUIDADO DAS VÍTIMAS 

Perguntado sobre o tipo de acompanhamento dado às vítimas a partir do momento que a denúncia é formalizada, o Cardeal explicou que será seguido o que prevê o Motu Proprio do Papa Francisco.

No artigo 5º, a carta apostólica diz que: “As autoridades eclesiásticas empenham-se para que sejam tratados com dignidade e respeito quantos afirmam que foram ofendidos, juntamente com as suas famílias, e proporcionam-lhes em particular: a) acolhimento, escuta e acompanhamento, inclusive através de serviços específicos; b) assistência espiritual; c) assistência médica, terapêutica e psicológica de acordo com o caso específico”.

O texto reitera, ainda, que serão tuteladas a imagem e a esfera privada das pessoas envolvidas, bem como a confidencialidade dos dados pessoais.