Despertar para a vida

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20/12/2017 - 11:00
“José, ao despertar do sono, agiu conforme o Anjo do Senhor lhe ordenara e recebeu em casa sua mulher.” (Mt 1,24)

Obras de ficção são muito populares, e muitas delas passam dos livros para os filmes ou telenovelas. Algumas vezes, os autores misturam personagens reais com a fantasia, criando histórias fantásticas que alimentam a imaginação das pessoas. Não existe nenhum problema com a leitura de um livro de ficção ou em assistir um filme desse gênero, mas é importante saber distinguir a fantasia da realidade. É preciso despertar para a vida real e conhecer suas consequências. 

Diferentemente de uma obra de ficção, a Sagrada Escritura não conta histórias de heróis nem reúne contos de fantasia, fruto da imaginação do homem. A Sagrada Escritura narra fatos e experiências da vida de homens e mulheres do povo de Deus e a maneira como essas pessoas despertaram para a vida. Essas narrativas se tornam modelos exemplares para nós, à medida que queremos fazer parte do povo de Deus. 

O nascimento de Jesus está entre as principais narrativas da fé cristã, porque mostra como Deus agiu, de forma extraordinária, naquilo que é simples. Maria e José são pessoas do povo, sem nenhum atributo ou qualidade de distinção, pois não se destacaram pelos seus méritos, mas pela escuta e pela obediência. Os dois não consideram os próprios desejos e projetos, mas se deixaram tocar pela graça de Deus, e por isso abriram mão das próprias vontades para acolher o Filho de Deus. Nos dois casos, a resposta positiva, a aceitação da vontade de Deus, teve consequências e desafios como a rejeição, a incompreensão, a dúvida, o exílio e o sofrimento. Como superar tudo isso? 

Na vida real, os acontecimentos não podem ser alterados ou controlados, como se estivéssemos escrevendo um livro de ficção. Cada experiência precisa ser vivida na sua intensidade, em que aparecem os sentimentos de alegria e de dor. Como mãe, Maria experimentou a alegria do nascimento e a dor da morte do seu filho na cruz. Como pai, José também experimentou alegria pelo nascimento, assim como tristeza e dor pela necessidade de exílio. Pessoas reais, em condições reais e que encontraram na fé e na abertura da vida para acolher o outro a força necessária para superar o medo, confiando na fidelidade de Deus e na sua aliança. 

O Natal é um convite a acolher o Verbo de Deus que se fez carne para habitar entre nós, e podemos encontrá- lo no próximo, oculto na simplicidade e fragilidade da humanidade. Em sua vida, Jesus experimentou o exílio, a incompreensão, a rejeição, o abandono e a morte, tudo isso envolvido pelo amor de Deus. O que não compreendemos pela razão, nós experimentamos pela fé, como Maria e José, e isso nos desperta sempre mais para a realidade da vida. Deus está no meio de nós, presente em cada pessoa, e ainda mais visível nos pobres, nos excluídos, nos doentes, nos anciãos, nos exilados e nos órfãos. Vamos ao encontro do Senhor, para acolher, com generosidade, a sua presença. Assim se celebra o Natal cristão.

 

Dom Devair Araújo da Fonseca
Bispo Auxiliar sa Arquidiocese na Região Brasilândia
e Vigário Episcopal para a Pastoral da Comunicação