‘Os leigos têm uma missão insubstituível’, afirma Cardeal

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<p>Dom Odilo concede entrevista ao O SÃO PAULO,com destaque a vida missão dos leigos.</p>
Publicado em: 02/09/2014 - 15:15
Créditos: Edição nº 3016 do Jornal O São Paulo – página 24

Na Catedral da Sé, o arcebispo de São Paulo, Cardeal Odilo Pedro Sherer, presidiu missa no domingo, 24, com destaque a vida missão dos leigos. Em entrevista ao O SÃO PAULO, Dom Odilo ressaltou que “cabe aos cristãos leigos, sobretudo, levar o fermento, o sal e a luz do Evangelho para as estruturas e organizações da sociedade”.

A Igreja vem refletindo bastante sobre a Nova Evangelização e sobre a necessidade de ser uma Igreja “em saída”. Que significa ser “uma igreja em saída?
Na exortação apostólica Evangelii Gaudium, o Papa Francisco exorta toda a Igreja a colocar-se em atitude missionária permanente e a não se contentar com uma “pastoral de manutenção”, voltada apenas sobre si mesma. Essa mesma orientação também já havia ficado clara na Conferencia de Aparecida (2007). O chamado a uma nova “missionariedade” e a ser uma Igreja “em saída” é feito tanto aos cristãos leigos como aos ministros ordenados da Igreja: ambos têm formas próprias de responder e de realizar a sua parte numa Igreja “em saída missionária”.

Qual é o papel do leigo para a concretização dessa missionariedade?
Cabe aos cristão leigos, sobretudo, levar o fermento, o sal e a luz do Evangelho para as estruturas e organizações da sociedade, onde eles estão inseridos como cidadãos; aí eles vão contribuir para que o mundo seja sempre mais iluminado pela luz do Evangelho e tenha o jeito do Reino de Deus. Isto requer dos leigos uma “conversão missionária”, ou seja, uma mudança de mentalidade, para compreender e aceitar que a Igreja, com tudo o que faz parte dela, não existe para si mesma, mas para a missão e para testemunhar a vida nova que vem do Evangelho; essa é a sua primeira e mais importante missão e sua própria razão de ser e existir.

É importante que o leigo participe da vida interna da Igreja?
Faz-se necessário participar da vida interna da Igreja, acolher sempre de novo a Palavra de Deus, celebrar e receber os sacramentos e contar com o apoio da vida comunitária; tudo isso é dom e graça de Deus, para cultivar a fé, crescer e amadurecer nela, em comunhão eclesial; mas esta participação, se for autêntica e bem compreendida, deve levar a uma atitude missionária mais dinâmica, generosa e perseverante. Não se pode guardar apenas para si os dons recebidos. A vida cristã bem vivida leva a ser bons discípulos-missionários.

Tanto o Papa Francisco quanto seus predecessores falaram em diferentes ocasiões sobre o risco de uma “clericalização” do laicato. Em que consiste isso, na prática?
A clericalização do laicato seria uma forma parcial de compreender e de realizar a vocação dos cristãos leigos, como se eles tivessem que assumir a missão própria dos ministros ordenados e da hierarquia da Igreja. Seria confundir as competências dos diversos membros do Povo de Deus e fazer do leigo um clérigo, ou pretender que sua missão se esgote inteiramente na vida intraeclesial, não levando a sério a “dimensão secular” da sua missão. O risco de clericalização está no não reconhecimento da vocação e missão própria dos leigos, como também da negação da vocação e missão própria dos ministros ordenados.

Como evitar a clericalização dos leigos?
A questão precisa ser bem compreendida: o Concílio Vaticano II não exclui os leigos da participação de todo o bem da Igreja; e os pastores da Igreja sabem que não foram instituídos por Cristo para assumirem sozinhos toda a missão salvífica da Igreja no mundo (cf.: Lumen Gentium, 30). De maneira própria aos leigos, e sem confusão com a missão própria do clero, os leigos também participam, na Igreja, da missão de anunciar o Evangelho, de santificar e de governar (cf.: LG 34-37). Em outras palavras, não devem se desinteressar pela vida da própria Igreja, ou sentir-se estranhos a ela; nem devem ser impedidos de assumir seu papel próprio.

O que é próprio da vocação e missão dos leigos?
Ao falar dos leigos na Igreja, o Concílio destacou a “índole secular” da vocação e missão do leigo: “específico dos leigos, por sua própria vocação, é procurar o Reino de Deus exercendo funções temporais e ordenando-as segundo Deus”. Aos leigos, portanto, “cabe de maneira especial iluminar e ordenar de tal modo todas as coisas temporais, às quais estão intimamente unidos, que elas continuamente se façam e cresçam segundo Cristo, para louvor do Criador e Redentor” (cf LG 31). O mesmo se diz novamente no decreto Apostolicam Actuositatem, sobre o apostolado dos leigos (cf. AA 2). Na Igreja, é preciso manter a clareza sobre a vocação e missão própria dos leigos e um sadio equilíbrio, para não reduzir seu papel a “complemento” de funções próprias dos clérigos. Os leigos têm uma missão insubstituível, própria deles, dentro da Igreja e no mundo: eles precisam ser formados para essa missão e estimulados a assumi-la com fé e generosidade.

Fernando Geronazzo