Migração: em todo mundo, o desafio de manter as identidades religiosas

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Simpósio cobre sobre a situação dos migrantes
Publicado em: 18/06/2015 - 14:15
Créditos: Edição nº 3056 do Jornal O SÃO PAULO – página 14

O “I Simpósio Internacional sobre Religião e Migração” aconteceu em São Paulo, entre os dias 8 e 10 de junho, no campus Perdizes da PUC-SP. O evento foi promovido numa parceria entre o Programa de Estudos Pós-Graduados em Ciências da Religião da universidade, a Missão Paz, o Centro de Estudos Migratórios (CEM) e o Scalabrini International Migration Institute (SIMI), de Roma.

“Mobilidade humana e identidades religiosas” foi o tema principal do Simpósio, que reuniu conferencistas nacionais e internacionais como os professores Fabio Baggio e Gioachino Campesi, ambos do SIMI e da Pontificia Università Urbaniana, de Roma. Relatos de experiências, comunicações e momentos culturais também fizeram parte da programação.

Transmitido pela Rádio Migrantes, em português e em espanhol, o evento ajudou numa releitura da história da imigração, sobretudo no Brasil, e desconstruiu mitos e preconceitos que podem dificultar a acolhida de imigrantes e refugiados.

Fabio Baggio, do Scalabrini International Migration Institute, falou sobre o panorama contemporâneo das migrações internacionais, o panorama religioso dos migrantes e os desafios que surgem a partir daí. Ele destacou que há 232 milhões de migrantes internacionais, correspondendo a 3,2% da população mundial. Contudo, 17 milhões são refugiados. “De 1990 a 2013, houve um aumento de 50% (77 milhões), a maioria com um fluxo entre 2000 e 2010 (4,6 milhões por ano). Destes, quase a metade (48%) são mulheres e 75% têm entre 20 e 64 anos”, afirmou.

Outro dado apresentado pelo professor foi a distribuição geográfica desses migrantes no mundo: na Europa, 72 milhões; na Ásia, 71 milhões; nos Estados Unidos da América e Canadá, 53 milhões; na África, 19 milhões; na América Latina e Caribe, 9 milhões; e na Oceania, 8 milhões.

‘A liberdade religiosa é também um motivo de migração’

Histórias comuns entre católicos, judeus e mulçumanos foram contadas na mesa final do evento, que teve como tema principal “Os nômades de Deus: diálogos inter-religiosos a partir da sobrevivência humana”. Tiveram a palavra o Rabino Michel Schlesinger, da Congregação Israelita Paulista; o Sheikh Mohamad Al Bukai, da União das Entidades Islâmicas; e o Pe. Alejandro Cifuentes, da Missão Paz.

O Rabino recordou que a Congregação Israelita Paulista foi fundada há 79 anos por judeus alemães que estavam fugindo do nazismo na Europa. “A vocação da Congregação durante os primeiros anos de existência foi a de acolher migrantes que desembarcavam no porto de Santos e se instalavam pertinho da estação da Luz, no bairro do Bom Retiro”, contou.

O Sheikh que nasceu em Damasco, capital da Síria, está no Brasil há oito anos e começou sua exposição ressaltando que ele mesmo é um imigrante neste “País feito de imigrantes que é o Brasil”. Ele lembrou que o calendário islâmico começa com a migração do profeta Mohamed. “Foi a migração que fez com que a religião islâmica seja uma religião forte. Assim, onde um mulçumano não pode praticar sua religião, ele deve sair para praticá-la. A liberdade religiosa é também um motivo de migração. A mais recente imigração dos árabes, nos últimos 30 anos, aconteceu devido às guerras e, nos últimos quatro anos, deve-se, sobretudo, à crise na Síria.”

Sobre os conflitos na Síria, na Líbia, no Iêmen e em outros países da região do Oriente Médio, o Sheikh reforçou a influência da questão política. “Eles não discutem direitos humanos ou democracia, mas o que há de riqueza. Estão usando a religião para promover interesses políticos e econômicos. Quando a religião é praticada, o resultado sempre vai ser paz e nunca conflito. O problema é sempre político”, disse.

Já o Pe. Alejandro mostrou as faces plurais da religião em manifestações populares dos imigrantes latino-americanos em São Paulo, sobretudo no que se refere às devoções marianas.

O crescimento da imigração em São Paulo

De janeiro a maio deste ano, a Missão Paz, na rua do Glicério, em São Paulo já atendeu aproximadamente 1.200 haitianos. Em 2014, o número chegou a 4.642. Segundo o Ministério da Justiça, este ano foram concedidos 5 mil vistos para haitianos; em 2014, foram 25.556 vistos. O número total, desde o terremoto em 2010, chega a 52 mil. Em relação à comunidade boliviana, segundo dados do Consulado da Bolívia, estima-se que até 2014 havia 350 mil bolivianos em São Paulo. Destes, apenas 100 mil têm os documentos regularizados.

Entre os desafios políticos, Padre Paolo Parise, diretor do CEM, que fez uma conferência sobre “Imigração no Brasil: os números e os desafios sociais e éticos”, lembrou a problemática de uma nova lei migratória e uma política migratória planejada e articulada. Ele lembrou, também, a necessidade de uma política continental para frear os “coiotes”, que realizam ilegalmente o transporte de imigrantes e são responsáveis por grandes tragédias como as que têm acontecido com navios de imigrantes que querem desembarcar na Europa.

Nayá Fernandes