É possível ser bem-sucedido atuando de maneira ética

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sabel Franco, Cardeal Odilo Pedro Scherer e Sérgio Cavalieri participaram do evento Diálogos com a Cidade, no teatro Tuca
Publicado em: 13/12/2017 - 13:45
Créditos: Redação

Ética no mundo empresarial foi o tema da terceira edição da série Diálogos com a Cidade, realizada no dia 6, no Auditório Paulo Freire no Teatro Tuca, da PUC-SP, em Perdizes. O evento foi promovido pela Arquidiocese de São Paulo em parceria com a PUC-SP e a Associação de Dirigentes Cristãos de Empresa (Adce). O tema do evento foi proposto no contexto dos recentes escândalos de corrupção envolvendo empresas. 

Participaram do debate o Cardeal Odilo Pedro Scherer, Arcebispo de São Paulo; Isabel Franco, Advogada que atua em âmbito internacional na assessoria e consultoria nos temas de combate à corrupção empresarial; e Sérgio Cavalieri, Engenheiro Civil, Empresário e Fundador e Ex-Presidente da ADCE. 

“Hoje se fala de crise política, econômica, social, mas, na base tudo, estamos vivendo uma crise ética e moral. Não apenas o mundo político está sendo questionado pelos fatos de corrupção, mas também o mundo empresarial, assim como outros campos da atividade humana, como o esporte, espetáculo, mundo financeiro e até o mundo religioso”, afirmou Dom Odilo.

 

Combate à corrupção 

Isabel Franco contextualizou o início da legislação de combate à corrupção empresarial. Segundo ela, tudo começou com o caso Watergate, nos Estados Unidos, escândalo de corrupção que resultou na renúncia do presidente norte-americano Richard Nixon, em 1974. 

Na época, após uma intensa investigação, descobriu-se que cerca de 400 empresas multinacionais dominavam o mundo político por meio de propinas aos partidos e aos candidatos. Anos depois, o Presidente Jimmy Carter sancionou a lei que punia pela primeira vez as empresas por corrupção com penas altíssimas.

Como essa era uma prática comum em todo o mundo, as empresas norte -americanas começaram a pressionar os outros países a criarem medidas anticorrupção para não ficarem em “desvantagem” em relação às concorrentes estrangeiras. Em 2000, os países membros da Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico (Ocde) assinaram uma convenção contra a corrupção nas transações comerciais internacionais. Embora o Brasil não fizesse parte da Ocde, o País assinou, assim como outras nações, um compromisso de criar uma lei similar. Somente em 2013 tal lei foi sancionada pela Presidente Dilma Rousseff. A partir de então, a empresa que pagar propina fica sujeita a altas penalidades. “Foi assim que tudo começou. De repente, as empresas aqui no Brasil se viram obrigadas a seguir uma lei pela qual elas têm de agir eticamente”, explicou a Advogada. 

 

O que é uma empresa ética? 

Ao responder o que seria uma empresa ética, Sérgio Cavalieri destacou que isso vai além do cumprimento de leis, pagamentos de impostos e o não pagamento de propinas ou envolvimento em corrupção. “É a empresa que produz bons produtos, bons serviços e úteis à sociedade, gera um trabalho bem remunerado e com boas oportunidades para as pessoas, que cria riqueza de forma sustentável e que a distribui de forma justa. As empresas éticas são humanizadas, solidárias, justas, buscam o bem comum, respeitam o ser humano e a natureza, atendem às necessidades das pessoas, geram bem-estar e são admiradas. E, além disso, ganham mais dinheiro e são mais lucrativas”. 

Para ele, apesar dos últimos acontecimentos e escândalos de corrupção com o envolvimento de empresários, “a ética está na moda” no mundo empresarial. “O desejo dos cidadãos e consumidores por empresas éticas vêm nesse bojo das transformações do mundo no século XXI [...]. Hoje as pessoas exigem cada vez mais transparência por parte das empresas e instituições”, acrescentou. 

Cavalieri destacou, ainda, que a ADCE tem se empenhado em mostrar aos empresários que ter um comportamento ético não é uma barreira, mas uma oportunidade de avanço e uma nova postura diante da sociedade. Um dos programas da associação é o “Empresa com valores”, que tem o apoio da Conferência Nacional dos Bispos do Brasil (CNBB), que forma grupos pequenos de dirigentes de empresas para estudar os documentos da Doutrina Social da Igreja.

 

O ser humano no centro 

Dom Odilo apresentou algumas referências da Doutrina da Igreja sobre a ética, especialmente nas Encíclicas Caritas in Veritate , do Papa Bento XVI, e Laudato Si ’, do Papa Francisco.  Dentro da ótica da globalização, Bento XVI destaca o desafio do mundo empresarial e da economia de levar em conta que a pessoa humana deve estar no centro, e a tecnologia com a globalização não pode vir em detrimento de enormes camadas sociais, países e até continentes inteiros que ficam preteridos na participação de novas possibilidades. “Por isso, o Papa incentiva os empresários a pensarem em novas formas de solidariedade no mundo do trabalho e novas formas cooperativas. Bento XVI recorda que não existe desenvolvimento bom se não é integral, no sentido de ser estendido a todos e que respeite a todos”, destacou o Cardeal. 

Já a Encíclica Laudato Si’, sobre o cuidado com a casa comum, vai além de um documento ambientalista, pois aborda a ecologia como uma questão ética e social que também diz respeito ao mundo empresarial. “O Papa Francisco coloca como grande critério ético que a natureza não é simplesmente um bem disponível e, portanto, é preciso um olhar responsável e não ganancioso sobre a natureza para que ela não seja deteriorada, para que possa continuar a servir a nós e às futuras gerações”, ressaltou Dom Odilo. 

 

Consciência e valores 

Isabel Franco elogiou a abordagem de Dom Odilo sobre a ética sob um ponto de vista diferente da discussão feita no âmbito jurídico. “Quando o senhor [Dom Odilo] menciona o bem social, colocar a pessoa no centro e não o lucro, penso que nosso mundo criou um arcabouço que permite que as pessoas pensem mais na função social e educativa das empresas e, por isso, melhorem os seus sistemas e controles para que possam fomentar o bem”. 

Para Sérgio Cavalieri, as leis e as regras para coibir a corrupção empresarial são necessárias, mas não suficientes. “O que garante o cumprimento da lei é a consciência das pessoas e os valores que elas trazem consigo”, completou o Engenheiro, que foi enfático ao garantir que é possível ser bem-sucedido atuando de maneira ética e sem ceder à corrupção. 

Promovido desde 2016, o Diálogos com a Cidade foi inspirado na iniciativa Pátio dos Gentios, realizada pelo Pontifício Conselho para Cultura, da Santa Sé, com o objetivo de promover a abertura do debate sobre situações e acontecimentos que envolvem a vida da sociedade.