Santa Maria Madalena - Testemunha da misericórdia divina

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Papa eleva memória da primeira a encontrar o Ressuscitado, ao grau de festa litúrgica.
Publicado em: 22/07/2016 - 13:15
Créditos: Texto: Fernando Geronazzo / Ilustração :Sergio Ricciuto Conte

Em 22 de julho, os católicos de todo o mundo irão celebrar pela primeira vez o Dia de Santa Maria Madalena como festa litúrgica. Por “decisão expressa” do Papa Francisco, a data até então celebrada como memória foi elevada ao grau festa no Calendário Romano Geral, em decreto da Congregação pelo Culto Divino e Disciplina dos Sacramentos, no dia 3 de junho. Chamada por São Tomás de Aquino como a “apóstola dos apóstolos”, Maria Madalena foi a primeira a ver Jesus Ressuscitado e a dar o testemunho da Ressurreição aos apóstolos. O secretário da Congregação para o Culto Divino, Dom Artur Roche, explicou que Francisco tomou essa decisão exatamente no contexto do Jubileu extraordinário da Misericórdia, para significar a importância dessa mulher, que mostrou um grande amor a Cristo e Cristo por ela, chamada por São Gregório Magno de “testemunha da misericórdia”. Santa Maria Madalena é venerada pelos cristãos do século I pela sua fidelidade e adesão a Jesus Cristo, como manifestou São João Paulo II na carta apostólica Mulieris dignitatem: “Santa Maria Madalena é o exemplo de verdadeira e autêntica evangelizadora, isto é, de uma ‘evangelista’ que anuncia a mensagem alegre e central da Páscoa”. 

Pecadora Arrependida? 

A tradição da Igreja no Ocidente, sobretudo depois de São Gregório Magno, identifica na mesma pessoa Maria Madalena, a pecadora arrependida que derramou perfume na casa do fariseu Simão, como narra o capítulo 7º do Evangelho de Lucas, e a irmã de Lázaro e Marta. Numa homilia proferida no ano 591, o Papa Gregório associa Madalena como uma pecadora pública, o que posteriormente se popularizou como sendo uma prostituta. Isso se deve ao fato de o relato da mulher pecadora vir imediatamente antes da passagem em que Maria Madalena é citada nominalmente no capítulo 8º. Outro fator que pode ter contribuído para essa associação era a má fama que sua cidade natal, Magdala, tinha por causa da imoralidade. A única coisa concreta que a Sagrada Escritura diz sobre o passado dessa Santa é que dela tinham saído sete demônios (Lc 8,2). A interpretação de que Madalena e Maria, irmã de Lázaro, eram a mesma pessoa manteve-se e teve influência nos autores eclesiásticos ocidentais, assim como na arte cristã e nos textos litúrgicos relativos a ela. Embora não existam nos Evangelhos objeções à opinião de que Maria Madalena era uma prostituta, também não há provas bíblicas concretas que permitam afirmá-lo. Esse pode ser o motivo pelo qual, em 1969, com a reforma litúrgica proposta pelo Concílio Vaticano II, as leituras da Bíblia empregadas na missa foram revistas e decidiu-se não continuar a usar o relato da pecadora arrependida como leitura na memória da Santa.

 Anunciadora da Ressurreição 

“De fato, Maria Madalena fez parte do grupo dos discípulos de Jesus, seguindo-o até aos pés da cruz e, no jardim onde se encontrava o sepulcro, foi a primeira ‘testemunha da misericórdia divina’. O Evangelho de João conta que Maria Madalena chorava, pois não tinha encontrado o corpo do Senhor (cf. Jo 20,11), e Jesus teve misericórdia dela fazendo-se reconhecer como Mestre, transformando as suas lágrimas em alegria pascal”, afirma Dom Roche. Ao ver o Senhor ressuscitado, Madalena cumpriu o mandato dado por Ele e foi ao encontro dos discípulos para anunciar: “‘Vi o Senhor’. E contou o que Ele lhe tinha dito” (Jo 20, 17-18). “Ela é testemunha de Cristo Ressuscitado e anuncia a mensagem da Ressurreição do Senhor, como os outros apóstolos. Por isso, é mais apropriado que a celebração litúrgica dessa mulher tenha o mesmo grau de festa que as celebrações dos apóstolos no Calendário Romano Geral, revelando a especial missão dessa mulher, que é exemplo e modelo para cada mulher na Igreja”, acrescenta o secretário do Culto Divino. 

Lendas e tradições

Embora não haja precisão histórica sobre passos dessa “apóstola” após a ascensão de Jesus, existem duas versões bastante difundidas entre os cristãos. Um dos relatos populares é que durante a segunda grande perseguição aos cristãos de Jerusalém, após o ano 45, os discípulos de Jesus se dispersaram pelo mundo. Os cristãos gregos afirmam que Maria Madalena teria acompanhado a Virgem Maria e São João Evangelista para Éfeso, tendo morrido e sido enterrada naquela cidade. Outra tradição igualmente popular acredita que ela e outros cristãos teriam sido presos em Jerusalém e lançados ao mar num barco sem remo, velas ou leme, a fim de perecerem num naufrágio. Entretanto, o barco dirigiu-se milagrosamente para a Sicília, e de lá para a Fran- ça, chegando finalmente a Marselha, que era então um dos principais portos das Gálias, no sul da França. Depois de ter trabalhado na conversão dos marselheses, Madalena retirou-se para viver na solidão em uma montanha entre Aix, Marselha e Toulon, onde permaneceu aproximadamente por 30 anos, levando vida contemplativa e penitencial até sua morte. No século VIII, suas relíquias foram trasladadas para um lugar seguro, tendo ficado esquecidas até que Carlos II, rei da Sicília e conde da Provença, as encontrou em 1272. Entretanto, a urna de Santa Maria Madalena desapareceu no século XVI, durante as guerras de religião entre católicos e protestantes.

 Ovo vermelho 

A iconografia ao longo da história retrata Santa Maria Madalena segurando um ovo vermelho nas mãos. Diz uma tradição que, após partir para a Europa, Maria Madalena conseguiu uma audiência em Roma com o imperador Tibério César. Sua intenção era denunciar o crime cometido pela negligência de Pilatos, e para isso contou-lhe a vida do Cristo, sua morte e Ressurreição. Ao terminar seu relato, ela pegou sobre a mesa de jantar um ovo branco para ilustrar seu ponto de vista sobre a Ressurreição. Ao ver isso, César replicou que era mais fácil um ovo branco se tornar vermelho do que existir alguém que retornou dos mortos. No mesmo instante, o ovo nas mãos de Maria se tornou vermelho como sangue. Embora seja fruto de uma tradição popular, esse símbolo perpetua o principal aspecto da vida dessa seguidora de Cristo: o testemunho da Ressurreição.

(Com informações do site Vatican.va)

Reportagem Publicada no Jornal O SÃO PAULO - Edição 3111/ 20 a 26. de Julho