As universidades católicas são um presente da Igreja para a comunidade

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Em entrevista exclusiva ao O SÃO PAULO, a professora Maria Amalia Pie Abib Andery falou sobre sua nova missão para o quadriênio 2017-2020 como reitora da PUC-SP.
Publicado em: 19/09/2016 - 14:45
Créditos: Edição 3119 do Jornal O SÃO PAULO /14 a 20 de setembro de 2016

Fernando Geronazzo/Daniel Gomes

Em entrevista exclusiva ao O SÃO PAULO, a professora Maria Amalia Pie Abib Andery falou sobre sua nova missão para o quadriênio 2017-2020 como reitora da PUC-SP, cargo para o qual foi nomeada na semana passada.

Doutora em Psicologia e atualmente no cargo de pró-reitora da pós-gradua- ção, Maria Amalia destacou o papel da universidade católica na sociedade e os desafios para manter a excelência acadê- mica histórica da instituição. “Nós somos bem reconhecidos no Brasil, mas pode- mos mais”, garantiu. Leia a entrevista :

O SÃO PAULO – O que significa para a senhora assumir a reitoria da PUC-SP?

Maria Amalia Pie Abib Andery - Para mim, pessoalmente, é o coroamento de uma carreira. Um cargo de reitor significa o maior reconhecimento que a comunidade pode dar a um professor. Institucionalmente, e isso é o mais importante, significa a oportunidade de contribuir para a construção das características dessa universidade que eu considero importantes. 

Quais são essas características?

A PUC-SP é uma universidade completamente diferente de todas as demais universidades particulares. Percebemos isso em tudo: no prédio, nas pessoas que circulam, na maneira como a universidade está implantada na sociedade. Uma característica que considero importante é o compromisso da universidade em contribuir para a construção de um país mais igualitário, mais justo. A segunda característica é a de manter o compromisso da universidade na formação de profissionais competentes e cidadãos conscientes. Outra é a de ser universidade que contribui com a produção de conhecimento.  

O que foi feito na gestão da reitora Anna Cintra e que será aprimorado na gestão da senhora?

Um esforço muito importante que foi feito, que precisamos garantir sua continuidade, é o de dar estabilidade e viabilidade financeira para a universidade, pois ela precisa saber andar com as próprias pernas. Eu destaco que a reitoria foi capaz de manter a autonomia intelectual da universidade. Também começou um esforço de retomar planos de adequação e atualização da infraestrutura tanto física quanto acadêmica. 

Como a senhora pretende reafirmar junto à comunidade acadêmica a identidade católica da PUC-SP, tendo em vista que parte dos alunos e alguns professores defendem que a universidade não tenha vínculos com a Igreja?

É indiscutível que a PUC-SP foi criada pela Igreja, seu patrimônio inicial foi doado pela Igreja, que tem um papel importante na gestão administrativa. Durante toda a campanha para a reitoria, eu defendi que o que cabe a nós é garantir a autonomia acadêmica e, ao mesmo tempo, dialogar com a Fundação São Paulo (Fundasp), que representa a Igreja. A PUC-SP sempre teve essa autonomia. Temos alunos e professores de diferentes crenças e nunca ninguém foi perseguido ou tolhido. Eu entendo que as universidades católicas do mundo afora são um presente da Igreja para as comunidades nas quais elas estão. A Igreja ajuda a manter uma instituição que tem um papel social único de trabalhar pela diminuição da desigualdade, aumento da fraternidade, por uma cultura de paz. Isso é ser católico. Preserva-se o caráter católico da universidade preservando seus valores mais importantes. 

O que pode ser aprimorado no relacionamento da universidade com a mantenedora?

Esse relacionamento é igual ao de uma família, construído cotidianamente. Vamos o tempo todo manter essa conversa com a Secretaria Executiva, o Conselho Superior, com o Cardeal [Odilo Pedro Scherer], sempre que ele considerar necessário. A universidade hoje tem uma autonomia acadêmica, a qual nós vamos sempre defender, mas temos uma dependência administrativa e financeira da Fundasp que é construída em conjunto. Os interesses últimos da universidade e da mantenedora são os mesmos. As eventuais tensões são consertadas no diálogo. 

Qual o planejamento para manter a excelência acadêmica em relação à renovação ou restruturação de currículos e cursos?

Eu digo sempre que a única alternativa real de sobrevivência da PUC-SP é o da excelência acadêmica. O Brasil hoje tem 7,3 milhões estudantes universitá- rios. Desses, mais de 5 milhões estão em universidades privadas, sendo que uma pequena parcela desse total está em universidades comunitárias, como é o caso da PUC-SP, que construiu uma história de excelência. Se não tivermos essa excelência acadêmica, ela não consegue sobreviver. No Brasil, os alunos que têm mais capacidades acadêmicas tendem a procurar primeiro as universidades pú- blicas governamentais antes das comunitárias ou particulares. Ou a PUC-SP é excelente ou é excelente. Nós somos bem reconhecidos no Brasil, mas podemos mais. Por isso, precisaremos atualizar a cartela de cursos, bem como suas estruturas, atualizar os docentes e a infraestrutura. Nós temos duas coisas muito boas a nosso favor: o reconhecimento da comunidade e um corpo docente muito bem qualificado. São, por exemplo, mais de 900 doutores nos nossos quadros. A universidade é um organismo vivo, uma estrutura social que depende da comunidade na qual ela está inserida. A histó- ria humana é de superação, mudança e transformação. A universidade também. Alguns cursos têm sentido num certo momento e deixam de ter em outro. Por outro lado, eu defendo sempre que algumas áreas são tão estruturantes da nossa socialização que precisam existir de alguma forma, já os cursos mudam. 

No programa de candidatura da chapa da senhora, há a afirmação de que as universidades precisam atender às demandas da sociedade contemporânea em áreas distintas daquelas que tradicionalmente compunham suas especialidades. Concretamente como isso poderá ser aprimorado em sua gestão?

Penso que a PUC-SP é muito tímida em algumas áreas como ciências exatas e tecnológicas, por exemplo. Temos excelentes cursos de Medicina e Enfermagem, mas poderíamos ampliar os nossos cursos nessas áreas. Mesmos na área de humanas, temos cursos excepcionais, como Psicologia, Ciências Sociais, Direito e Economia. A universidade pode crescer em áreas nas quais ou temos sido muito tímidos ou sequer existimos. Vamos ter que sentar e discutir um pouco para identificar quais são elas exatamente. Temos que pensar em termos de curto, médio e longo prazo. Vou dar um exemplo: o tema da ecologia é importante atualmente, inclusive o Papa Francisco o colocou em pauta recentemente. A PUC-SP não tem nada nessa área. Há muitas maneiras de nos aproximarmos dessa temática. 

Que expectativas a senhora tem para o ensino superior com o governoTemer?

Nos últimos 12 anos, houve muita novidade para a universidade. Fomos de 3,5 milhões para 7 milhões de estudantes universitários. Ingressaram grupos sociais que até então não tinham acesso ao ensino superior. As classes populares tiveram acesso à universidade, inclusive na nossa, por meio de programas como o Prouni. O país não pode parar de crescer nesse sentido. Eu temo que, em nome da chamada estabilidade ou austeridade financeira, o ensino superior seja afetado. Seria muito importante que esse ciclo de investimento e de crescimento na universidade não mudasse de padrão. O trem não pode parar, senão perderá uma geração de jovens até que se movimente novamente. Falamos aqui de investimento do Estado em universidades governamentais, em programas de acesso à universidade privada, o financiamento de infraestrutura das universidades. Essas políticas públicas contribuem para que possamos cumprir o papel social que temos. Por outro lado, a PUC-SP sempre se saiu muito bem em momentos de crise. Agora nós temos uma nova oportunidade de mostrar para o país que nós sabemos fazer a diferença. Não importa de que lado as pessoas estejam, há uma crise institucional, política, social e econômica no país. A PUC-SP tem como contribuir para ajudar na diminuição da crise e na construção de caminhos novos para o Brasil.