Catequese da JMJ: Jovens "Firmes na Fé"

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17/09/2011 - 00:00

O tema escolhido pelo papa Bento 16  para esta Jornada da Espanha é belo, profundo e tem um significado muito atual: “Enraizados e edificados em Cristo, firmes na fé” (cf l. 2,7). O texto é da Carta aos Colossenses e São Paulo exorta os fiéis a não se deixarem abalar na própria fé em Cristo por aqueles que os perturbavam com outros ensinamentos e propostas religiosas, ou não-religiosas.

O tema aponta para a realidade central da vida cristã: Nossa referência e relação essencial com Cristo. Ser cristão é ser discípulo de Cristo; é estar ligado a ele com uma relação estreita e vital e dele receber a vida nova, mediante a fé e o batismo. São Paulo diz que significa “estar nele”, ser edificados sobre ele, estar enraizados nele. Em outro lugar ainda Paulo diz que isso significa que “já não somos mais estrangeiros e estranhos a Cristo e a Deus, mas concidadãos dos santos e membros da família de Deus” (cf Ef 2,11-19). Sem esta referência a Cristo, o cristão perde o rumo e a Igreja, o seu sentido.

A Igreja aponta para Cristo e convida a encontrá-lo, a se deixar encantar por ele, a experimentar a alegria e a paz de estar em sua companhia, a acolher sua Palavra, a seguir atrás dele pela vida afora. Sim, porque Ele é o Salvador, o “pão” que mata toda fome e faz viver para sempre; a água que mata toda a sede; Ele é o Pastor que ama seu rebanho e dá a vida pelas ovelhas; é a porta aberta que leva direto ao encontro com Deus; é a luz, que permite caminhar na vida sem tropeçar e sem errar o caminho, a verdade, a vida... Isso interessa aos jovens?

Em nossos dias, o cristão encontra-se muitas vezes desafiado a viver a sua fé em Deus e em Cristo num contexto de esquecimento de Deus, numa espécie de “eclipse do sentido de Deus”, quando não da clara negação de Deus. Renascem movimentos de afirmação militante do ateísmo, da negação de Deus e do sentido da fé e da vivência religiosa. Sempre mais se afirma o laicismo na vida pública e se pretende até legislar para tirar dos espaços públicos os sinais e símbolos religiosos, sob o pretexto do “Estado laico” ou da “liberdade” daqueles que não crêem.

E os jovens são envolvidos por movimentos que por vezes os fazem duvidar da própria fé, da fé da Igreja e do próprio Deus. No entanto, vocês têm o direito de buscar e de conhecer a fé e de se alegrar quando a encontram e vivem.

Quando se coloca Deus de lado, também o homem e o mundo perdem a referência principal de seu sentido e de sua dignidade. Sem uma referência consciente ao criador, o homem perde sua dignidade e sua identidade. O esquecimento de Deus está na origem de tantos problemas do mundo e da sociedade em nossos tempos. Por isso, é necessário e urgente que se reconheça novamente o primado de Deus na vida do homem. “Tudo muda, dependendo se Deus existe, ou não existe” (Card. Ratzinger, Jubileu dos Catequistas e professores de religião, 10.12.2000).

Na sua Mensagem para a esta Jornada Mundial da Juventude, o papa Bento 16 escreve: “Deus é a fonte da vida; eliminá-lo, equivale a separar-se desta fonte e, inevitavelmente, privar-se da plenitude e da alegria. Sem o criador, a criatura se dilui (Gaudium et Spes, 36). A cultura atual, em algumas partes do mundo, sobretudo no Ocidente, tende a excluir Deus ou a considerar a fé como um fato privado, sem nenhuma relevância para a vida social. Mesmo se o conjunto dos valores, que são o fundamento da sociedade, provém do Evangelho – como o sentido da dignidade da pessoa, da solidariedade, do trabalho e da família -, constata-se uma espécie de “eclipse de Deus”, uma certa amnésia e mesmo uma verdadeira rejeição do cristianismo e uma negação do tesouro da fé recebida, com o risco de perder aquilo que mais profundamente nos caracteriza” (n. 1).

Que significa crer em Deus e naquele que Ele enviou ao mundo, Jesus Cristo? A fé é um dom recebido no Batismo; mediante este dom, Deus se manifesta e se dá a conhecer ao homem, envolvendo o homem com a sua presença e sua benevolência. (Abraão ... Moisés... Jeremias... Maria, José, Paulo... etc...)

O homem quer “ver Deus”, conhecer Deus e entrar em diálogo com Ele...  “Não me escondas a tua face, Senhor, para eu não ser como os que descem ao túmulo” (Sl 143,7). “Por que me escondes o teu rosto e te mostras meu inimigo?”(Jó 13,24); “Mostra a teu servo um rosto radiante e ensina-me teus mandamentos” (Sl 119,135). Jesus Cristo, Filho de Deus vindo ao mundo, manifesta ao homem o rosto de Deus – “rosto humano de Deus e rosto divino do homem”... “Filipe, quem me vê, vê o Pai” (Jo 14,9).

A fé ilumina a vida daquele que crê e a transforma. Só com a fé em Deus, mediante a qual o homem pode entrar em comunhão com Deus e estabelecer com ele um laço de confiança, é que a vida do homem encontra sua plenitude. O homem foi feito para Deus e não encontra paz enquanto não se encontrar com Deus: “Tu nos fizeste para ti, Senhor, e nosso coração anda inquieto enquanto não repousa em ti novamente, Senhor” (S.Agostinho).

No Evangelho, Jesus valoriza e louva muito a atitude de fé e convida os discípulos a crescer nesta virtude: da mulher Cananéia - “ó mulher, grande é tua fé! Seja-te feito como queres!” (Mt 15,28); da mulher hemorroissa: “tem confiança, filha, a tua fé te salvou” (Lc 8,48); “se tiverdes fé como um grão de mostarda direis a esta montanha: vai daqui para lá e ela irá. Nada vos será impossível” (Mt 17,20). E repreende a falta de fé dos discípulos, no caso da tempestade acalmada: “como sois assim tão medrosos? Ainda não tendes fé?” (Mc 4,40).

A fé é um dom de Deus, uma das 3 virtudes teologais recebidas no Batismo junto com o dom da filiação divina. Mas ela também é uma virtude nossa, que precisa ser assumida e desenvolvida. Ela representa, de nossa parte, a atitude de adesão a Deus. Tendo encontrado Deus, por Cristo, e conhecendo-o, aderimos a ele com firmeza. O papa Bento 16 escreveu, na encíclica Deus caritas est, que a fé e a vida cristã, que dela decorre, não são o fruto e a conclusão de um raciocínio nem decorrem de um alto ideal ético. Elas decorrem do encontro com a pessoa de Jesus Cristo e de Deus.

Quando temos fé verdadeira, não mais contamos simplesmente com nossas forças e com o alcance daquilo que humanamente podemos. A fé sobrenatural nos permite “edificar sobre Deus”, colocar nosso pé numa base firme, que não somos nós mesmos, nem é algo de humano, mas é o próprio Deus e sua fidelidade. “Abraão creu e esperou contra toda esperança...” (cf Rm 4,18). Podemos então edificar nossa casa sobre a rocha de sua palavra: “Por causa de tua palavra, Senhor, lançarei novamente as redes” (cf Lc 5,5); “Senhor, a quem iríamos nós? Tu tens palavras de vida eterna” (cf Jo 6,68). Paulo, uma vez que encontrou Cristo e aderiu a ele pela fé, apostou tudo nele, entregou sua vida a ele e ao anúncio do Evangelho: “vivo, mas já não sou eu que vivo, é Cristo que vive em mim” (cf Gl 2,20) “Tudo posso naquele que me dá forças” (cf Fp 4,13; cf Catecismo, 153-155).

A fé é um dom, mas também um ato pessoal: “eu creio!” - empenha inteiramente nossa pessoa e nossa vida. Por isso, ela deve ser cultivada e alimentada, para se desenvolver, crescer e amadurecer durante a vida. Se não for alimentada e cultivada, ela enfraquece, morre e desaparece. Infelizmente, é o que acontece tantas vezes com as pessoas. Como alimentar a fé? Na oração, que é o encontro e diálogo pessoal com Deus, que alimenta e aprofunda a comunhão com ele; na leitura/escuta e acolhida da palavra de Deus, que lança luz sobre nossa fé; na prática da caridade... A fé amadurece também na prova e no sofrimento, quando nossa generosidade é exigida. Os frutos da fé manifestam-se através da perseverança, mesmo nas provações, na capacidade de fazer escolhas coerentes com a fé, na vida moral e na virtude, na capacidade de orientar toda a nossa vida com serenidade para Deus, na alegria e na paz interior.

Diz ainda o papa Bento XVI na sua Mensagem para a Jornada Mundial da Juventude 2011: “a fé é, antes de tudo, um adesão pessoal do homem a Deus; ao mesmo tempo, e é inseparavelmente, também o assentimento livre a toda a verdade que Deus revelou” (Catecismo, 150). Assim, podereis adquirir uma fé madura, sólida, que não se fundamenta unicamente num sentimento religioso ou numa vaga recordação do catecismo da vossa infância. Podereis conhecer a Deus e viver autenticamente dele, como o apóstolo Tomé, quando professou abertamente sua fé em Jesus: “Meu Senhor e meu Deus!”

A fé nos faz aderir firmemente a Deus e a tudo o que Deus significa e revelou para nós. Com freqüência, o ato de fé é incompleto: “creio em Deus, mas...” A tendência é fazer cortes no conjunto das verdades de fé, sobretudo desvincular a fé da prática vivida: viver, na prática, como se Deus não existisse, ou nada significasse na nossa vida e na vida do mundo... É o ateísmo prático. Um Deus “excluído” do mundo não equivale ao Deus da revelação bíblica e da fé cristã.

A fé poderia parecer um passo irracional. Fé e razão se contrapõem? Não, certamente (cf Catecismo, 155-159). Temos motivos para crer. Crer em Deus é um ato humano razoável, com o qual o homem se abre a Deus, em vez de se fechar na estreiteza de suas próprias seguranças, entrega-se a Deus, confia nele e dele recebe uma luz e uma graça superiores para conhecer e aderir com plena certeza à verdade.

E não estamos sozinhos em nossa fé, mas cremos com a Igreja e como a Igreja creu e crê. Nossa fé está amparada pela comunidade de fé, assistida pelo Espírito Santo. Cremos como/com os apóstolos, os mártires, os santos doutores, místicos, pastores, evangelizadores, missionários, homens e mulheres que gastaram sua vida na caridade, por causa dessa fé... Estamos em boa companhia! Cremos com nossos Pastores e guias da comunidade de fé, com o papa João Paulo 2º, o papa Bento 16, Madre Teresa... S.Teresa, S.Francisco, S.Inácio, S.Antônio!

Portanto, jovens, “firmes na fé”, enraizados e edificados em Cristo, “autor e consumador de nossa fé” (cf Hb Hb 12,2). Firmes também com a Igreja, comunidade de fé. Não estamos sozinhos. E não queiramos ficar sozinhos, pois perderemos o rumo e a fé; na comunidade de fé, somos amparados e fortalecidos, com o testemunho de tantos irmãos e irmãs!

Catequese de língua portuguesa na Paróquia Nossa Senhora do Rosário de Fátima, em Madri, durante a Jornada Mundial da Juventude, em 17/8